Declaração de Lula sobre a transposição do São Francisco na Paraíba provoca críticas e reacende debate sobre discurso político e religiosidade

Nesta quarta-feira (28), durante a entrega do primeiro trecho do Ramal do Apodi, na Barragem Redondo, em Cachoeira dos Índios (PB), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) causou controvérsia ao afirmar: “Deus deixou o sertão sem água porque sabia que eu ia ser presidente da República e ia trazer água pra cá” . A frase, dita em meio a um discurso sobre a transposição do Rio São Francisco, foi interpretada como uma “blasfêmia” que coloca Lula “acima de Deus”.
A declaração veio em um evento carregado de simbolismo. O Ramal do Apodi, parte do Projeto de Integração do São Francisco, é uma obra iniciada no governo Lula em 2007, paralisada sob Dilma Rousseff e retomada com avanços significativos nos governos Temer e Bolsonaro, antes de sua entrega parcial em 2025. Lula destacou que a promessa de levar água ao Nordeste, debatida há 179 anos, foi concretizada em sua gestão, beneficiando 1,4 milhão de pessoas em 54 cidades da Paraíba, Pernambuco, Ceará e Rio Grande do Norte. “Era uma obra que muita gente não acreditava que a gente fosse fazer”, disse, atribuindo a si um papel central no feito.
A reação foi imediata. No X, a hashtag #LulaBlasfemo ganhou tração, com posts chamando a fala de “insana” e acusando Lula de arrogância: “Como DEFECA pela boca, PQP ”. Críticos alegam que o presidente usou a religiosidade do povo nordestino, majoritariamente cristão, para autopromoção, em um momento de 55% de desaprovação. O pastor Silas Malafaia classificou a frase como “heresia” e “tentativa de se equiparar a Deus”.
Por outro lado, aliados do PT defenderam a fala como uma expressão retórica de emoção, destacando o impacto social da obra: “Lula lembrou que o projeto garante aquilo que Deus dá a todo mundo: um copo d’água para beber”. O próprio Lula, no discurso, vinculou a entrega a uma missão pessoal, citando sua infância em Caetés (PE), onde enfrentou a seca, e prometeu crédito para gás de cozinha, criticando preços de até R$ 140. Para o cientista político André Singer, em coluna na Folha, a frase é um “exagero típico de Lula”, que usa metáforas populares para conectar-se ao eleitorado nordestino.
O contexto político amplifica a polêmica. Com a base de João Azevêdo (PSB) na Paraíba dividida entre Cícero Lucena (PP), Lucas Ribeiro (PP), Adriano Galdino (Republicanos) e Hugo Motta (Republicanos) para 2026, a visita de Lula reforça sua influência local, mas a frase pode alienar eleitores conservadores, onde a oposição, liderada por Romero Rodrigues (Podemos) e Efraim Filho (União Brasil), ganha terreno. Além disso, a crítica de Malafaia a Motta por não pautar a anistia do 8 de janeiro indica que o Republicanos, aliado de Lula, pode sofrer com a associação.
A fala de Lula não é novidade — em 2024, ele já dissera que “Deus escolheu um nordestino” para levar água ao Nordeste. Se blasfêmia ou não, depende da lente: para uns, é arrogância; para outros, um recurso discursivo. O que é certo é que, em um Brasil polarizado, onde o STF e Lula enfrentam críticas por autoritarismo e onde a carga tributária de 32,4% do PIB frustra o povo, cada palavra do presidente vira munição. O Ramal do Apodi leva água ao sertão, mas a polêmica mostra que Lula ainda precisa apagar incêndios.

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