Associação em Serrambi pretende entrar na Justiça para barrar empreendimento imobiliário em área de mangue

A Associação Enseadinha, situada em Serrambi, Litoral Sul de Pernambuco, no município de Ipojuca/PE, pretende entrar na Justiça para barrar a construção de resorts em uma região onde os empreendimentos invadem um espaço considerável de mangue, dentro de uma Área de Proteção Ambiental (APA) e em um loteamento no qual só é permitido construir residências unifamiliar.

O Loteamento Enseadinha nasceu e foi registrado no ano de 1989. Com o tamanho pré-definido desde a sua origem, o local tem formações de áreas verdes, de mangue, de preservação ambiental proporcionando uma convivência harmoniosa entre os usuários e o campo natural de suas preservações. No local, por exemplo, há uma vida marinha diversificada com a preservação do cavalo marinho e as desovas das tartarugas nas praias dessa área ao longo dos 12 meses do ano.

Por ter se preocupado em sua preservação e respeito às convivências, Enseadinha se valorizou em relação a outras áreas que foram previamente degradadas no Litoral Sul e Norte do Estado, a exemplo de Muro Alto, Porto de Galinhas, Tamandaré, Itamaracá e Maria Farinha.

Na contramão dessas outras cidades, em Enseadinha, as vias de acesso, os esgotamentos sanitários, o fornecimento de energia, a geração de Lixo, coisas básicas de cada unidade unifamiliar estão dimensionados e previstos desde a sua fundação. Esse zelo e preocupação dos fundadores do Loteamento, agora, estão ameaçados por conta da especulação imobiliária.

Apesar desses empreendimentos imobiliários terem conseguido aprovações junto ao Poder Público Municipal com autorização para construção de unidades habitacionais multifamiliares (condomínios), é importante salientar que o terreno em questão tem proibição expressa para tal obra. E o mais grave: os projetos ignoram completamente o meio ambiente e não possuem licenciamento ambiental, já que a construção invade uma área de preservação.

Isso sem falar nas afrontas às convenções contratuais urbanísticas, que de forma extremamente cuidadosa foram inseridas pelo Loteador no Memorial descritivo do Loteamento de Enseadinha e são de observância obrigatória aos proprietários de lotes da área em questão. São regras que dizem respeito aos recuos, ao uso estritamente residencial e unifamiliar, padrão de ocupação dos lotes, suas metragens e confrontações, as diretrizes acerca da procedência da água de consumo, disposição do esgoto sanitário, coleta de lixo, entre outras questões.

Por isso que a violação desses padrões com a execução de empreendimentos de grande porte pelas Incorporadoras, afrontando características como a destinação da área para fins meramente residências, por óbvio, acabará por descaracterizar completamente a região, acarretando no desuso das normas de restrição urbanística e se permitindo, a longo prazo, a construção e instalação da maior variedade de habitações coletivas, colégios, hospitais, hotéis, pousadas, clubes, enfim, qualquer atividade do ramo da indústria e do comércio.

Fazendo um breve adendo sobre a questão legal que envolve a situação, destaca-se que por serem as normas convencionais supletivas e complementares ao Plano Diretor do Município, no podem ser encaradas em confronto com este último, uma vez que mais abrangentes do que as regras contidas na legislação de forma genérica, não existindo, assim, qualquer razão para que não sejam seguidas as restrições urbanístico-ambientais do Registro de Loteamento de Enseadinha.

Sobretudo porque, de acordo com os precedentes do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema, estas restrições denotam interesse público e privado, incorporando uma natureza que segue o imóvel em relação aos seus efeitos sobre os não-contratantes. Ou seja, é uma estipulação em favor de terceiros para que os proprietários-sucessores e o próprio empreendedor imobiliário original não percam o poder e a legitimidade de fazer respeitá-las.

Com isso, ao continuar se permitindo a realização de grandes empreendimentos com unidades habitacionais multifamiliares (condomínios) na região, como fica o direito adquirido dos titulares dos demais lotes que se tornaram proprietários de imóveis dentro do Loteamento acreditando na obediência das normas que proibiriam a descaracterização da região?

Lei Federal n. º 4.591

Além dessa questão de irregularidade, ainda há o fato de que alguns empreendimentos que estão sendo executados na região também estão em desacordo com a Lei de Condomínio e Incorporações, Lei Federal n. º 4.591, de 16 de dezembro de 1964, dado não existir o prévio e necessário registro anterior do memorial de incorporação.

Citada Lei dispõe as obrigações e responsabilidades específicas para que se possa pôr à venda imóveis em construção, criando mecanismos de segurança para o empreendimento e para o consumidor/adquirente, determinando que o Incorporador providencie o registro de Memorial de Incorporação, que depende de vasta documentação como por exemplo título de propriedade, discriminação das frações ideais, das áreas privativas e áreas comuns, além de atestado de idoneidade financeira.

Ocorre que justamente pela dificuldade de se reunir toda essa documentação, algumas Incorporadoras estão acabando por promover a anunciação e venda de empreendimentos, dentro do Loteamento de Enseadinha, sem o devido registro do memorial, o que pode acarretar em diversos danos, principalmente aos consumidores.

Uma pessoa que compra um imóvel sem o chamado RI (Registro de Incorporação) estará sempre sob o risco de adquirir algo totalmente diferente daquilo que negociou. Isso porque, por exemplo, enquanto o projeto está na prefeitura, pode sofrer alguma adequação ao processo que foi dado entrada para análise. E aí, consequentemente, quem já tenha iniciado uma negociação ou comprado esse imóvel anterior a essa alteração acha que comprou uma coisa, mas vai receber outra. Isso sem falar que os bancos só costumam financiar tanto a empresa quanto o comprador final mediante apresentação do RI.

Empreendimento irregular

O empreendimento irregular em questão pretende construir “condomínios” nos lotes de 03 a 09. Pelas imagens abaixo é clara a invasão ao mangue, protegido por lei.

Em suma, uma série de razões impede a execução dos empreendimentos que grandes Incorporadoras estão pretendendo na região, sendo completamente inviável que se permita a continuidade das obras que ocasionarão na completa descaracterização da área, a afronta ao direito adquirido dos proprietários dos demais lotes e os danos ambientais permanentes.  

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