Percepção de perseguição judicial fortalece narrativa de vítima do ex-presidente e polariza ainda mais o Brasil

A frase “Alexandre de Moraes é hoje o maior cabo eleitoral do Bolsonaro” ressoa como uma provocação que ganhou força entre apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e críticos do Supremo Tribunal Federal (STF). Em 2025, com o ministro Moraes liderando investigações e decisões que mantêm Bolsonaro inelegível até 2030 e seus aliados sob pressão, a narrativa de uma perseguição “injusta e desumana” se consolida como o principal combustível para a base bolsonarista. Casos como o “Julgamento de Débora” e a inclusão de Bolsonaro em inquéritos como o da delação de Mauro Cid reforçam a ideia de que Moraes, ao mirar o ex-presidente, paradoxalmente o fortalece. Mas até que ponto essa percepção é verdade?
Desde 2019, com o inquérito das fake news, Moraes tornou-se o rosto do STF na cruzada contra o que a corte chama de ameaças à democracia. Em 2025, suas ações atingiram um novo patamar: Bolsonaro é réu em sete inquéritos, enfrenta buscas, teve o passaporte retido e viu aliados como Anderson Torres presos. O julgamento de Débora Rodrigues, condenada a 14 anos por pichar “Perdeu, mané” em 8 de janeiro, é apontado como exemplo de desproporção, enquanto decisões como o arquivamento do caso de Ibaneis Rocha (MDB) alimentam a acusação de dois pesos e duas medidas.
A narrativa de vítima é poderosa. Bolsonaro, inelegível por decisão do TSE, usa eventos como o protesto no Rio em 16 de março para se posicionar como alvo de um “tribunal de exceção”. Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) e Flávio Bolsonaro reforçam o discurso, comparando as penas do 8 de janeiro a “vinganças políticas”. A desaprovação de Lula em 55% (CNT/MDA, fevereiro/2025) e a queda de confiança no STF (31%, Datafolha 2024) criam terreno fértil para essa retórica. Para analistas, a percepção de injustiça galvaniza a base bolsonarista, que vê em Moraes um símbolo de autoritarismo, elevando Bolsonaro a mártir — mesmo sem ele concorrer diretamente em 2026.
Moraes, por sua vez, parece ciente do paradoxo. Em entrevista à Folha (15/03/2025), defendeu que suas decisões visam “proteger a democracia, não perseguir pessoas”, mas evitou comentar Bolsonaro diretamente. O STF sustenta que o 8 de janeiro justificou medidas duras: a PGR endossou as denúncias, e condenações como a de um réu que tentou explodir uma bomba no aeroporto de Brasília (17 anos) mostram o rigor da corte. Ainda assim, críticas como as do jurista Ives Gandra Martins, que acusa o STF de violar a separação de poderes, e o editorial da Folha sobre o caso Ibaneis, apontando “canetadas” de Moraes, sugerem que o Judiciário paga um preço por sua cruzada.
O efeito “cabo eleitoral” é inegável em 2026. Embora Bolsonaro não possa concorrer, sua influência deve impulsionar aliados como Tarcísio e Michelle Bolsonaro, que já aparecem em pesquisas à frente de Lula. Cada nova ação de Moraes amplifica a narrativa de perseguição, mobilizando a direita. Se o STF continuar a apertar o cerco, o risco é que, em vez de neutralizar o bolsonarismo, fortaleça um movimento que se alimenta da indignação. No Brasil polarizado, Moraes pode estar, sem querer, escrevendo o próximo capítulo da saga de Bolsonaro.

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